tudo se resolve

ora cá estou eu....demorou... peço desculpa às minhas queridas silhuetas de entulho!

pois é, apesar da "ressaca" ainda me mantenho a pé por estas horas, é verdade..
mas antes de ir pró "eterno descanso" quero contar-vos uma história.


dormia eu no comboio a ouvir música muito alta nos fones, eis que acordei e, apesar do volume, ouvi alguém cantar..rapidamente tirei um dos fones, olhei para trás e estava um miúdo descontraído, ao lado da irmã, suspeitei eu, com a cara tapada pela cortina do comboio, a cantar infantilmente sempre ao mesmo ritmo, sempre com a mesma melodia...
pensei: mas que raio! o puto não se enxerga! que sarnoso, a irmã deve estar fartinha dele, mas mesmo assim não lhe impõe respeito... eu na idade dele teria vergonha de estar ali a cantar à frente de tanta gente desconhecida...
concerteza estaria a cantar d´zrt, andré sardet ou raio que os parta....voltei a por os fones com a música ainda mais alta. Olhei para a senhora ao meu lado; estava a olhar para trás. Pus a música na pausa sem tirar os fones.

tomei mais atenção e comecei a ouvir: "está um menino atrás de mim com uma camisola vermelha, não não é vermelha é lilás, tem umas calças pretas e uns ténis pretos com umas caveiras brancas, os seus olhos são castanhos, o cabelo preto. Não sei o nome dele... Tenho muitos amigos, é bom ter amigos, tenho amigos em Lisboa, mas agora estou a fazer novos amigos, como o menino que está atrás de mim."
Esqueci-me de tudo o que tinha pensado antes. Como é possível? Além de estar ali a cantar em voz alta, está a inventar letras sobre quem o rodeia? será que vai falar de todas as pessoas que estão aqui? E se todos fossemos assim? Com certeza já vos aconteceu querer conhecer alguém e não saber como o fazer... Mas esta ideia de começar a cantar parece-me estranha... Iríamos envergonhar qualquer pessoa adulta, ou até irritar, mas quem sabe não achariam piada e talvez até seja um bom começo... Que estará a pensar o tal menino de olhos castanhos? Com a idade que parece ter certamente não deve estar a achar muita piada..

E ele continuou: "Hoje na escola plantei uma plantinha muito bonitinha, era vermelhinha no interior, verde por fora, era muito bela, a natureza é muito bonita, devemos tratar bem dela, ouçam bem, não se esqueçam, tudo se resolve."
Merece ser comentada esta parte... Não pela plantinha mas pela parte em que ele falou no plural a apelar a toda a gente de que "tudo se resolve". Ele repetiu isto montes de vezes! TUDO SE RESOLVE! tudo tem solução! Que quereria ele dizer com isto?? com aquela idade...(ah tinha 7 anos! segundo a sua canção :) ) com 7 anos não se pensa em resoluções! seja do que for quanto mais resoluções na generalidade! Enquanto me intrigava ria-me sozinha...o que intrigava a mulher ao meu lado que não parava de olhar pra mim e para ele. Não sei porque não se ria também desta situação... Afinal, estava um puto a inventar cenas enquanto cantava quem nem um mendigo num comboio silencioso!

"Vou no comboio, a caminho de Lisboa, vou ter com o meu pai, que está à minha espera, para se ser pai é preciso ser forte e corajoso, são assim os pais, os nossos melhores amigos, com que podemos falar de tudo, com quem podemos sempre contar, com eles tudo se resolve. Não são mais ninguém para falarem assim de uma forma ou de outra, são os teus pais. Não são ninguém sem voces."
Não sei que pensar desta parte... Sei que neste momento parei de rir. E pensei que algo se passava com ele. Nunca fui muito de expressar sentimentos. Sempre me foi dificil dizer perante os meus pais que os adoro. Qualquer pai que ouvisse aquilo se comovia..O miúdo parecia estar a despejar todas as lições que os pais costumam dar aos filhos..

A irmã finalmente mandou-o calar. Não se calou e continuou sempre com a mesma melodia...
"Estou feliz, sou feliz a cantar, sinto-me bem, estou ao pé dum menino, e doutro pessoa, e doutra, e doutra, e doutra, e doutra ..."

Calou-se. Quando voltei a olhar para trás estava ele sentado no chão de forma estranha a mexer num saco com pêras nas mãos e a falar que nem um desenho animado. Não tardou estava a falar com o tal menino, o "meu menino", segundo ele. Levantou-se de forma estranha para se sentar na cadeira. Disse ir à casa de banho e foi a andar de forma estranha enquanto se apoiava em todos os braços das cadeiras por onde passava, voltou muito rápido. Levantou-se outra vez, foi até à porta do comboio e voltou a correr. Fê-lo várias vezes cada vez mais rápido. Não percebi se aquela forma de andar era verdadeira ou se estava também na brincadeira...

Peço desculpa se escrevi muito...mas fiquei a pensar em várias coisas...deixo-vos a reflectir.

A propósito. Obrigada malta! Pelos últimos dias! Fico cada vez mais feliz por vos conhecer :D